A Jornada do Herói e o RPG - Dicas rápidas para utilizar nas suas mesas


Saudações Humanos, aqui quem vos fala é o Tretaman do Pentáculo Budegueiro, o filho renegado de Loki e Éris, o sobrinho mal amado de Seth, o Bardo de Qualidade Questionável: DIO! *gritos de horror da plateia*

Sim caros leitores e ouvintes, hoje quem lhes trará a palavra sou eu, dando continuidade à nossa série de dicas sobre narrativa de RPG, onde iremos percorrer agora a JORNADA DO HERÓI.

Neste post você irá descobrir: O que Matrix, Star Wars, Hobbit, Batman, Tomb Raider (e praticamente tudo no mundo das histórias de narrativa) tem em comum.

Você irá aprender tanto como Jogador, quanto como Mestre, a usar (e abusar) do que há de melhor (e pior) da Jornada do Herói em suas campanhas, e principalmente: Como criar histórias inesquecíveis e personagens memoráveis.






Alguém, por ventura, pode acabar perguntando: “Mas, Dio, a Jornada do Herói não serve apenas para jogos onde os personagens são, errr... não sei, errr... heróis?” AHHHHHHHH como eu adoro esse tipo de pergunta... vamos por partes como diria Joãozinho da Machadinha:

A Jornada do Herói é uma sequência de acontecimentos que ocorrem, geralmente, com os protagonistas de uma história, e isso independe das motivações morais dos personagens: se eles são Bons e Leias ou Caóticos e Maus, não importa, o que importa é o trajeto e como esse modelo de contar histórias funciona (e olha que ele funciona desde que o mundo é mundo), afinal de contas, anti-heróis e vilões podem ser ainda mais icônicos em uma mesa de RPG do que um grupo de heróis.


Parte I: O Inicio, A Separação e O Parto

                               

A)   O Mundo Comum:

(Para os Jogadores) Todo personagem (na minha humilde opinião) deve ter uma boa base, um bom background (e isso vale até mesmo para aqueles personagens que tem amnésia, pois são construídos durante a campanha "se lembrando do passado", o que dá no mesmo de ter um bom background no final das contas) e o primeiro passo na Jornada do Herói é o "Mundo Comum".  Para se construir um bom personagem, comece de baixo, literalmente pelo comum, ora bolas: “Quem era ele antes de se tornar um vampiro/cavaleiro/ciborgue/super-herói?”; “Onde morava?; "Como era sua vida?"; Como era tratado pelas pessoas a sua volta?”, essas perguntas ajudam a criar um chão sólido onde Mestre e Jogador podem caminhar ao estabelecer os contatos dos personagens, o lugar onde viveram, a forma como eram tratados, o trabalho que exerciam e etc, tudo isso influencia diretamente, dando um Norte para a interpretação daquela persona que se está construindo, como por exemplo suas manias, seus trejeitos, suas particularidades e formas de pensar.

Quem era Tony Stark antes de ser o Homem de Ferro? Um gênio, bilionário, playboy e filantropo! Ta, e de onde veio sua genialidade? Seu dinheiro? Sua showdebolice? Do seu background como filho de um gênio da engenharia, mimado pelo dinheiro do império da família e mesmo assim tendo um bom coração (ou quase).


Ah vá


Não está convencido? E se pegarmos outro personagem? Que tal a Sakura do Sakura Cardcaptor? Quem ela era antes de se tornar uma heroína das Cartas Clow? Uma garotinha, estudante, que foi criada pelo pai, que é irritada pelo irmão e ama o Yukito...


WHAT!!??

Percebem como esses detalhes simples enriquecem a personalidade? Isso tudo é determinado no "Mundo Comum", e nunca esqueçam: o Diabo está nos detalhes.

(Para os Mestres) No Cenário o “Mundo Comum” é onde são apresentados os problemas que assolam os personagens antes deles terem a capacidade/motivação para mudar tudo ao seu redor, demonstrando como eles se “viravam” para viver, “O pai que tinha que trabalhar para sustentar a família e pegou empréstimo com agiotas em uma cidade corrompida e controlada pela Máfia” ou, “O escudeiro de um cavaleiro errante que tem que manter as armas de seu mestre sempre limpas e afiadas enquanto uma nuvem escura da guerra se aproxima”, ou ainda “A pequena criança órfã que tinha que aprender a se esconder dos valentões, enquanto rumores de um monstro negro de garras alongadas rondava os corredores do orfanato a noite eram contados pelas crianças mais velhas”, em fim, é aquilo que delimita o problema geral do dia-a-dia do cenário e como o personagem lidava com isso antes de começar a Jornada.

Aqui a narrativa demonstra o quão vasto é o mundo e seus problemas: "As colheitas mal sucedidas do fazendeiro são o menor dos seus problemas, principalmente quando nos campos de milho verde do vizinho ao lado surgem estranhos desenhos na vegetação..."


B)   Chamado à Aventura:

(Para os Jogadores) Logo em seguida, temos o elemento do “Chamado à Aventura”, este é um elemento que pode ser feito tanto durante o jogo quanto no background do personagem. É aqui que estabelecemos o ponto onde o personagem sofre uma reviravolta na vida, “Um garoto rico tem os pais assassinados após saírem do cinema”; “Homens de preto lhe perseguem no trabalho sem nenhuma explicação”; “Um bando de anões invade sua casa, comem toda sua comida e lhe oferecem um contrato”, em fim, é algo que ocasiona uma mudança drástica, de preferência irreversível, que altera totalmente a vida comum do personagem para sempre.

(Para os Mestres) No cenário, indica o momento crucial do primeiro contato com a “Razão dos Problemas” do seu mundo, embora fossem presentes antes, é agora que a consciência deles afeta de forma direta os personagens (tanto PJs quanto NPCs), é neste ponto que se faz insustentável a continuidade das coisas como estão: “Todos sabem que a Máfia operava na cidade, mas quando ela começou a invadir casas e executar os seus devedores, foi o momento que o terror se fez presente no coração da pacata vizinhança”; “Os dragões sempre dominaram o mundo, mas quando o primeiro dragão vermelho desceu dos céus em um inferno de chamas e fumaça, foi possível sentir a pressão que sua existência exercia sobre todos da região”. Deve ser usado para impulsionar os jogadores a tomarem uma atitude, é a chamada "Destruição Criativa", afinal, se Não Doí Não Constrói!

Exemplos: A mãe de Eren do Attack on Titans morre devorada pelos Titãs, queimando o ódio do protagonista por estas criaturas e o levando a se unir a Tropa de Exploração do exercito. Ou quando os Agentes da Matrix metem um inseto robótico no umbigo de Neo, removendo sua boca, o que o impulsiona a procurar Morpheus por sentir que havia algo de errado com o mundo.


Cereja ou Eucalipto?


C)   A Recusa:

(Para os Jogadores) Após o Chamado, geralmente ocorre a “Recusa”, este é um momento de dramaticidade para o seu personagem, é aqui que se estabelecem as suas fraquezas, suas limitações, onde ele tem noção de não ser capaz de enfrentar o desafio imposto e não vê alternativa a não ser fugir. Estabeleça traumas, medos, insegurança, defeitos, seja criativo ora raios!

É a Recusa do Superman em aceitar a capa; a negação de Katniss em se tornar o Tordo da Revolução ou, a agonia de Louis ao se tornar um vampiro.

Deve-se ter em mente que este elemento não é apenas o "calcanhar de aquiles" (ou a kriptonita) do seu personagem, é algo que irá diferenciá-lo de qualquer outro personagem, pois existem centenas de bárbaros naquela montanhas, mas somente o seu é traumatizado por não ter barba!


(Para os Mestres) Já para o cenário, indica o momento de relutância em relação a mudança, o comodismo que os NPCs do Mundo Comum vivem,  é a hora que ninguém se levanta para lutar, onde preferem abaixar a cabeça e fingirem que não ouvem o espancamento da adolescente no beco ao lado. Deixe claro que somente os  jogadores tem o dever de tomar a iniciativa, afinal eles são jogados ali por Livre e Espontânea Pressão.


D)   Encontro com o Mentor

(Para os Jogadores e Mestres) É durante a  Recusa, a Fuga, Medo e etc, que ocorre o “Encontro com o Mentor”, geralmente é uma figura de forte carisma e impacto para a trama que: ensina, dá suporte, treinamento e um motivo para abandonar a Recusa e seguir a Jornada. Este elemento, logicamente ficaria mais a cargo do narrador, como por exemplo aquele Genitor que ensina o vampiro a usar seus poderes, ou, o velhinho no topo da montanha  que ensina o ataque secreto que pode garantir a vitória. É aqui que se estabelece o Mestre Yoda da história, aquele NPC foderoso que direciona os personagens para os objetivos da campanha, sendo ótimo para evitar metagames e de forma sutil indicar o caminho que o narrador planejou para a aventura. Interessante ressaltar também que este Mentor pode ser uma figura “maligna”, como o Darth Vader do jogo Star Wars Force Unleashed, onde seu discípulo é treinado no lado Negro da Força, provando assim que a Jornada do Herói é mais cinza do que se imagina. 


Rita Repulsa está atacando!! Ai ai ai ai! 


E)   Cruzamento do Limiar  

(Para os Jogadores) O elemento seguinte é o “Cruzamento do Limiar”, é o momento no background que estabelece o “Rito de Passagem” do seu personagem como uma figura importante para o cenário, é a hora de transição que define de fato quem é o protagonista da história, quando ele aceita o fardo que lhe é dado e parte para a Jornada. É quando o personagem se “emancipa” de seu Mentor, e começa agir de acordo com o seu papel. Por exemplo quando Goku está no Torneiro de Artes Marciais e tem que enfrentar o Mestre Kami disfarçado, ou quando Batman se rebela contra a Irmandade das Sombras e toma seu próprio destino ao escolher salvar Gotham e não destruí-la.


(Para os Mestres) Para o cenário, o mestre deve transformar o Limiar em um momento de amadurecimento dos personagens, “a primeira missão”, “a fuga da prisão”, “o atravessar para o mundo espiritual”, “o primeiro inimigo derrotado”, dando assim o peso dramático necessário para marcar o ponto onde começa o jogo pra valer e onde termina o que era só introdução e background dos jogadores.


F)   Testes, Aliados e Inimigos

E que comecem os jogos! Aqui é onde (eu considero) o inicio da aventura, literalmente o começo da Jornada do Herói, é neste ponto que se estabelece o contato entre os aliados (aquele encontro ocasional na Taberna manja?), os desafios (A derrubada de hidromel do cara mais carrancudo da taberna), testes (A pancadaria que se desenrola depois do hidromel derrubado) e a apresentação dos inimigos/desafios que deverão ser superados pela trupe marota (Descobriram que depois de dar uma sova no carrancudo, ele era filho do general fodão do Reino que colocou a cabeça de vocês a prêmio).


Corre negada!!!


Parte II  - A Caverna, A Provação e O Tesouro


A)   A Aproximação da Caverna

É um dos momentos mais supimpas dos jogos de RPG, nesta etapa o Mestre, após toda a construção do cenário, imposição de desafios, testes e inimigos vencidos, estabelece o momento de enfrentar a Mãe de Todos os Males, é aquele momentinho sublime onde o grande Boss-Da-Porra-Toda está se aproximando, onde os jogadores estão prestes a enfrentar o desafio final, é a hora em que Neo esta na chuva cara a cara com o Agente Smith; Thorin estuda o Orc Branco sobre o gelo; Pica-pau elabora o contra ataque contra Zeca Urubu... aqui os jogadores devem estar tensos, ansiosos, é um momento psicológico de preparação, onde todo os artefatos, estratégias, armas e aliados devem estar reunidos para enfrentar o Desafio Final, sabendo que podem falhar diante do tamanho da muralha que deverão enfrentar.

B)   Provação

E então chega a hora que a Barata Voa, a Cobra Fuma e a Jiripoca Pia, é o clímax (um dos) da aventura, é onde os personagens dão tudo ou nada, onde não existe melhor de três, é o confronto com o desafio derradeiro da campanha! Sendo assim, se os personagens vão enfrentar um dragão, uma horda de zumbis ou um tsunami, e se os objetivos deles forem matar, salvar, fugir... não importa! Esse é o ponto onde não se deve ter piedade de gastar Força de Vontade, Pontos de Mana ou Balas de Metralhadora, é o momento em que os protagonistas brilham!


Brilha brilha estrelinha


C)   Recompensa

Boss-Motherfucking derrotado, vem a “Recompensa", que (cuidado nessa parte!), não deve ser apenas aqueles trocentos pontos de XP ou, aqueles zilhões de peças de ouro do baú do tesouro, deve haver um elemento dramático satisfatório para a trama, como por exemplo:  o reconhecimento dos NPCs; uma narrativa brilhante e épica dos acontecimentos seguintes; a exaltação em particular de cada membro do grupo em seus feitos e etc, isso torna o jogo mais rico e não apenas algo mecânico (embora ganhar XP sempre seja bom, mas não é tudo!) .

Muita gente quando chega a esse ponto do RPG para de jogar, mas a Jornada do Herói vai além disso, e o tio Dio vai ensinar a vocês uma das coisas mais legais da Jornada: O Ciclo!



III – O Retorno, A Perseguição e a Ressurreição


A)   Estrada de Volta

Após vencer o Desafio Final e pegar a Recompensa, está na hora do Herói retornar para sua antiga vida, a paz novamente reina no reino, a cidade foi salva, a louça foi lavada, e é aqui que na narrativa o mestre dá a famosa "respirada" para os jogadores, eles melhoram os personagens com XP, descrevem o que fizeram depois da campanha, em fim, amadurecem com a liberdade criativa que só um jogador de RPG consegue ter. Este elemento pode fazer parte da Recompensa, que instiga e abre ainda mais o cenário do mestre, acrescentando detalhes e apêndices ao mundo onde se passa a campanha, liberando assim ganchos para (caso queiram) uma nova crônica!

B)   Perseguição

Utilizando-se dos ganchos e das expansões do cenário, é o momento perfeito para tremer as estruturas novamente, “Uma nova sombra ameaça a paz conquistada a duras penas”, é onde desafios são colocados, não para mudar o cenário, e sim para mantê-lo de acordo com o que foi conquistado pelos jogadores; ótima parte para se colocar conspirações em seus jogos, usar PJs antigos como NPCs icônicos do cenário e etc, pois uma das coisas mais legais em dar continuidade a um jogo assim é perceber (enquanto jogador) que suas escolhas influenciaram direta e indiretamente o cenário.


Não Pensem que acabou!

C)   Ressurreição

O elemento conhecido como “Ressurreição”, ao meu ver, não é muito utilizável, uma vez que se trata da “purificação” do personagem em algo maior e melhor, usado muito na mitologia e na literatura, não é muito útil para contar um RPG (a não ser que sua mesa seja de Dragon Ball Z e todos sejam Kuririns), por isso substitua a Ressurreição por um novo Cruzamento de Limiar, uma transição dos personagens a uma nova esfera de influencia dentro do cenário. Não entendeu? Simples, troque o momento que o Gandalf se torna Branco, pelo momento em que o Seya ganha a Armadura de Ouro de Sagitário no Ultimo Minuto; ou quando Rock sobe as escadarias e está pronto para outra; ou mesmo quando o Batman sai de dentro do Buraco, literalmente #FiKDiK. 

D)   Retorno com Elixir

Por fim, e não menos importante, vem o elemento do “Elixir”, onde o personagem, agora, trás a solução para os problemas do Mundo Comum de onde veio, seja ele se tornando aquele que irá proteger todos com a força adquirida ao longo da Jornada; ou encontrando a cura para a doença letal que causou o Apocalipse Zumbi;  ou até mesmo sendo aquele que fechou o acordo de paz com os Orcs que atazanavam o Reino; Este elemento pode muito bem ser uma das formas de Recompensa já citadas anteriormente.

Bem nobres leitores, escolham a sequência que desejarem, não importa se vão começar pela B da II ou a III da A, o Ciclo da Jornada do Herói se repete ETERNAMENTO, e sem dúvida aqueles que sabem usar esses elementos consegue manter mesas épicas por anos com muito mais facilidade.

Observem qualquer filme da cultura pop, a maioria deles terá pelo menos 3 elementos da Jornada do Herói, é um padrão que funciona, e que sem dúvida vai funcionar na sua mesa também, e se não funcionar deixe sua reclamação para mim nos comentários, ou mande um e-mail para radiobudega@gmail.com ou (depois de nos curtir no Facebook, é claro) deixe uma mensagem na nossa página Rádio Budega.

Atenciosamente: Tretaman, vulgo, Dio. 

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